O conto “Felicidade clandestina”, de Clarice Lispector, é o relato de um acontecimento do passado da relatora, demonstrando o quão cruel alguém pode ser, mas também a resistência e a esperança humanas.
Com efeito, a história centra-se na narradora, que adorava ler, e numa menina, a filha do dono da livraria, que decidiu vingar-se por ter ciúmes da beleza da protagonista. O plano da rapariga consistia em dizer-lhe que iria emprestar-lhe um livro que ela desejava ler, só para, depois, quando o fosse buscar, contar-lhe que já o tinha dado a outra pessoa, que voltasse no dia seguinte, repetindo o esquema durante semanas. Esta ação revela o tamanho da maldade da filha do livreiro, que, em vez de ajudar a narradora ao dar-lhe o objeto que ela não conseguia adquirir, torturou-a por sentir-se excluída, já que não era tão bonita quanto as outras. Porém, também apresenta a resiliência e a força de vontade da protagonista, que queria apenas conhecer a história da obra.
Ao longo do conto, a autora utiliza recursos expressivos, como, por exemplo, a metáfora - “enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso” (linha 44) e “eu era uma rainha delicada” (linha 86) -, que acentua a malícia da menina e a felicidade da narradora ao receber o livro, respetivamente. Também estão presentes a enumeração e a adjetivação - “Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados.” (linhas 1 a 2) - que enfatizam a fealdade da rapariga. Estes recursos não só nos ajudam a compreender melhor o ponto de vista da personagem principal, como ainda embelezam o texto.
Em suma, na minha perspetiva, o conto de Clarice aborda a crueldade, a resistência e o amor à leitura, recorrendo a recursos expressivos, de forma a captar a atenção do leitor para a história. Recomendo, assim, a sua leitura para todos os que têm uma paixão por livros, que, de certeza, irão identificar-se com a protagonista.
Ana Sofia Oliveira (9º B, nº 4)
Artigo publicado no Diário de Coimbra (8 de novembro de 2025, p. 9)
Professora: Isabel Torre